A herança de todos nós: prisões mentais
Semana passada conversava com uma amiga que conheço há mais de duas décadas e compartilhávamos aquilo que faz parte das nossas agendas mentais: a saúde dos filhos e dos pais, carreira, aspirações e conflitos familiares. A minha amiga mora no exterior há 20 anos e consegue enxergar com bastante objetividade as relações entre os seus familiares. Eu também passei quase 16 anos distante da minha família, e compartilho da mesma objetividade ao observar e não me identificar com os comportamentos dos meus familiares mais próximos. Ao dividirmos abertamente aquilo que vivíamos, enxergamos com clareza como os ciclos de comportamento se repetem, perpetuando crenças de uma realidade que não precisa mais existir. Enxergamos que, por estarmos distantes há tanto tempo, conseguimos desenvolver a frieza e a força para decidirmos não participar mais da perpetuação de ciclos que promovem comportamentos e crenças que não nos pertencem, absorvendo aquilo que nos alimenta de verdade e nutrindo os nossos meios com as nossas mais puras intenções. Estou me referindo às prisões mentais que herdamos de gerações passadas.
Prisões mentais herdadas de gerações passadas podem ser um peso pesado em nossa vida. Muitas vezes, sem percebermos, carregamos crenças limitantes, traumas e medos que foram passados de geração em geração. Essas prisões mentais podem afetar negativamente nossa saúde mental, nossa autoestima e nossa capacidade de prosperar.
A verdade é que muitas das prisões mentais que carregamos foram transmitidas por nossos pais e avós, que por sua vez as receberam de seus próprios antepassados. Seja a ideia de que o sucesso é inalcançável, que o dinheiro é o único caminho para a felicidade, ou mesmo a ideia de que a vida é um fardo que deve ser suportado, essas crenças podem ser extremamente limitantes.
O primeiro passo para quebrar o ciclo de sofrimento é identificar essas crenças limitantes. Muitas vezes estamos tão acostumados a elas que nem sequer percebemos que elas existem. É importante, portanto, estarmos ciente de nossos pensamentos e comportamentos e questioná-los com frequência. Pergunte-se: essa crença é realmente minha, ou é uma herança de gerações passadas? A ajuda de um terapeuta, coach ou bom amigo é bem-vinda aqui.
O segundo passo é praticar a autoaceitação e a compaixão. Muitas vezes, nossas prisões mentais estão ligadas a sentimentos de vergonha, culpa e inadequação. É importante lembrar que todos nós temos nossas próprias batalhas internas e que é normal ter medos e inseguranças. Ao praticar a autoaceitação e a compaixão, podemos começar a nos libertar desses sentimentos negativos e criar uma base sólida para a mudança. Recentemente eu escrevi sobre o ego e sobre o medo do fracasso, que são temas complementares à quebra das prisões mentais.
O terceiro passo é conseguir distanciar-se da situação, desenvolvendo uma leitura objetiva do cenário e escolhendo não mais fazer parte daquele ciclo. Às vezes é preciso distanciar-se fisicamente para então nos afastarmos emocionalmente, como aconteceu comigo e com a minha amiga. Desenvolver o autoconhecimento, entendendo o que de fato é importante para você longe dos rótulos e expectativas daqueles que nos são importantes, faz parte do caminho para a independência emocional. Além disso, ter alguém que entenda o que você está passando e possa oferecer suporte pode ser extremamente útil na jornada de cura; no entanto essa pessoa não pode fazer parte do seu ciclo limitante.
É importante destacar que nossos familiares só querem o nosso melhor, e que estas prisões acontecem inconscientemente. A única forma de alcançarmos o nosso melhor e ajudarmos aqueles que amamos, no entanto, é quebrando o ciclo limitante. Durante o processo de mudança, este rompimento e o alcance da independência emocional podem ser percebidos por pessoas queridas como frieza uma vez que não nos comportaremos conforme o esperado. A comunicação objetiva, calorosa e calma permite deixar claras nossas decisões e intenções, sem agredir ou julgar, apenas informando o que é importante para cada um e por que decidimos seguir um caminho diferente.
Fácil falar, difícil fazer: a mudança não acontece da noite para o dia. Quebrar o ciclo de sofrimento pode ser uma jornada longa e difícil, mas é possível. Com autoconsciência, compaixão e apoio, podemos começar a criar uma nova narrativa para nós mesmos e para as gerações futuras.