Um ensaio de aposentadoria, mas no pico da performance, vitalidade, maturidade e energia. Uma pausa da correria insana, divertida e emocionante de uma carreira que mudou diversas vezes, sempre atrás de mais significado, impacto e, claro, reconhecimento. Uma aventura em família, mostrando para as crianças aquilo que eu gostaria de ter vivido e aprendido na prática, na sala de aula da vida, durante meus anos escolares. Um convite a “se jogar” no mundo, me permitindo deixar a intuição guiar mais do que a razão (sempre fui pago pela razão, e a intuição… bom, a coitada foi deixada de lado). A oportunidade de realizar vários itens da minha “bucket list”, aqueles sonhos que escrevi ao longo da vida e que agora posso riscar do papel.
Assim começou meu break profissional em 2023: 40 anos, dois filhos com 5 e 7 anos, uma esposa companheira com flexibilidade de carreira, e um planejamento financeiro que sempre esteve no meu radar.
Filho de funcionários públicos, cresci com uma disciplina financeira que me preparou para conquistar tudo sozinho. A minha independência financeira sempre foi prioridade.
Em maio de 2023, me desliguei do fundo de venture capital onde co-liderava operações na América Latina. Em julho, parti de mala e cuia com minha turma linda para uma viagem pelo mundo, grande parte dela a ser concentrada em Bali, na Indonésia.
Foram 300 dias de estrada, 9 países, muitas aventuras, simplicidade, alguns luxos, amigos incríveis e crianças que voltaram fluentes no inglês — e, mais importante (eu espero que sejam), mestres em entender que a vida e o mundo são abundantes, criativos e cheios de possibilidades. Que reinvenção está no nosso DNA, que criar é a nossa essência, e que rotina é ótima porque nos permite operar com o mínimo de fricção, mas que o apego a ela pode virar prisão.
Prisão é medo. Medo que sufoca a coragem e arruma justificativas para não fugir da rotina, para não mudar.
O tempo da pausa e o retorno
Hoje, olhando para trás, me sinto realizado, corajoso, desapegado e vivo por ter feito este sonho acontecer. Foi um tiro no escuro porque foi a primeira vez que me permiti ficar sem remuneração por um período indeterminado. Partimos sem passagem de volta, com o futuro profissional a ser endereçado depois.
Meu foco estava em construir a melhor experiência possível para o meu time. Mas, claro, como sou ansioso, não desliguei completamente do profissional. Dei tração ao meu trabalho de criação de conteúdo aqui no substack, no LinkedIn, Instagram e YouTube, lancei um podcast que me trouxe ótimas conversas e muito aprendizado, comecei mentorias, e passei a exercer meu papel como advisor e conselheiro para empresas em crescimento e transformação.
Ainda assim, a (pequena) receita disso durante a viagem nem de longe cobria as despesas, mas me trouxe uma sensação de propósito e conexão, que eu sabia ser fundamental.
A vida e o privilégio de escolher
A vida é curta. Sabemos disso.
Durante nossa vivência em Bali, cheia de sabores exóticos, ondas incríveis, templos e uma magia única, li Four Thousand Weeks, de Oliver Burkeman. Sim, temos apenas 4.000 semanas por aqui. Passa rápido. O livro falou diretamente ao que eu estava sentindo e não sabia como colocar em palavras.
"A vida é curta, mas não da maneira que pensamos. O problema não é que temos pouco tempo. O problema é que gastamos mal o tempo que temos."
Viver o que vivemos é um privilégio, e muitos de nós não aproveitam esse privilégio, mesmo podendo. Seja por medo, ou por não saber como se reposicionar no mercado ao voltar, ou pela comodidade da rotina.
As surpresas que vivemos como família — viajando de trem pela Tailândia, participando de cerimônias e aniversários em Bali, rodando a Ilha Sul da Nova Zelândia de campervan — não têm preço. E valeu cada segundo.
Talvez daqui a 5 anos façamos outra. Mas o futuro é incerto, e o que temos é o agora.
Sou grato por viver a vida que construí de forma deliberada. Não foi de graça, não caiu do céu, não foi fácil. Foi divertido, às vezes difícil, sempre cheio de aprendizados. Hoje sinto o cheiro do mar todos os dias, e foi intencional.









Dicas práticas para quem se coçou ao ler até aqui
Construa o sonho com sua família ou parceiro(a). O apoio mútuo é essencial. Planejar algo tão grande como um sabático não deve ser uma decisão solo, mas uma jornada compartilhada. Isso cria uma experiência mais rica e significativa para todos.
Planeje financeiramente para não depender de renda durante o sabático. Isso te dá a liberdade de estender a viagem e explorar o mercado com calma, buscando o que realmente faz sentido. Se você planeja ficar 10 meses em sabático, eu recomendo que tenha pelo menos 20 meses de reserva financeira para se permitir aproveitar com calma.
Contribua com sua comunidade profissional — mentorias, conteúdos, aulas… Compartilhar e criar me trouxe propósito, um senso de pertencimento, me fez muito bem.
Volte com calma, sem expectativas. Quando você retorna, é importante reconectar genuinamente com sua rede. As melhores oportunidades não aparecem em LinkedIn ou em sites de emprego, elas surgem nas conexões reais que você construiu ao longo da vida. O retorno ao mercado precisa ser um processo natural, sem pressa.
Tenha um plano B empreendedor. Ter uma alternativa mais flexível pode te surpreender. Muitas vezes, o caminho mais alinhado com o que buscamos surge fora do tradicional mercado executivo. O empreendedorismo oferece mais possibilidades e liberdade para construir algo que tenha sentido pessoal.
Cuide do corpo e da mente. Antes, durante e depois. Atividade física é fundamental, e para mim tem que ser todos os dias. Exercício, alimentação e sono são o triângulo fundamental para o sucesso em qualquer área. Eu voltei em abril de 2024 já inscrito na Maratona de Dresden, que aconteceu em outubro. Esses planos que me forçam a manter uma rotina bem estruturada de nutrição, treino físico e descanso sempre trazem resultados incríveis para todas as áreas da vida.
Do momento de entregar meu crachá como gestor de fundo, em maio de 2023, até o meu ingresso no meu desafio profissional atual, passaram-se quase 20 meses. Jamais imaginei que faria tudo isso, e que ficaria tanto tempo desconectado do mercado formal. Às vezes, me sentia desconfortável com os questionamentos dos mais próximos sobre o que eu "estava fazendo", mas a maturidade nos faz perceber que curiosidade é parte da natureza humana e que, no fim, somente eu sabia e era responsável pelo que estava vivendo. Minhas escolhas.
Uma pausa não é o fim. É um novo começo.
Fazia tempo que não escrevia com tanta fluidez. Esse texto saiu de uma vez só, porque eu precisava dividir o que me fez tão bem e que pode beneficiar outras pessoas.
Aquela aposentadoria de largar a caneta e não trabalhar nunca mais pode ser um convite ao vazio. Ser relevante, útil, ajudar o próximo, faz bem. Alimenta a alma.
Por que ter uma aposentadoria apenas na velhice, quando podemos ter várias mini-aposentadorias ao longo da vida?
Um abraço, e vamos que vamos!
Alex
P.S.: Abaixo, uma amostra do que foi a chuva de flores na despedida do Kai e da Aisha da Marigold Community Learning, uma escola que foi um presente, nos surpreendendo em todos os sentidos. As crianças, e seus pais, choraram ao partir. Love you, Marigold!
P.S.2: A Daiana, minha parceira, é uma excelente escritora, e eu super recomendo seu substack para quem curte uma escrita autoral leve, poética, sensível. Eu sou fã, veja aqui :).
"O dia nunca chegará em que você finalmente terá tudo sob controle—quando o fluxo de e-mails tiver sido contido; quando suas listas de afazeres pararem de crescer; quando você estiver cumprindo todas as suas obrigações no trabalho e na vida pessoal; quando ninguém estiver bravo com você por perder um prazo ou deixar algo cair; e quando a pessoa totalmente otimizada que você se tornou puder, finalmente, se dedicar às coisas que a vida realmente deveria ser sobre. Vamos começar admitindo a derrota: nada disso vai acontecer."
― Oliver Burkeman, Four Thousand Weeks: Time Management for Mortals
Que saudades, que orgulho, que bênção, que especial! Emocionada com as lembranças e com o seu texto.
E obrigada pelo apoio de sempre, meu parceiro! ♥️
Excelente post Alex. Tenho 52 anos e estou atravessando uma fase profissional e pessoal cinzenta, tenho dificuldade em replanejar minha vida profissional. Consequentemente fui me afastando da vida social, dedicando a estudos e trabalho. Na tempestade muitas vezes precisamos alguém que um olhar de fora para refletirmos e definirmos um plano de fuga. Caso o amigo tenha disponibilidade poderíamos conversar?? Certamente uma pequena conversa me ajudaria muito. Seu relato é interessante brilhante. Forte abraço e Tenha uma excelente semana.