O que eu aprendi em Harvard
Dez anos atrás eu recebia o canudo desta instituição que nem cabia nos meus sonhos de criança
Faz uma década que completei meus 2 anos de estudo na Harvard Business School (HBS). Cheguei em Boston em agosto de 2011, com o coração apertado por ter deixado minha companheira em Lausanne, na Suíça, onde vivemos pelos 3 anos anteriores (eu trabalhando na Nestlé, ela cursando seu PhD), e com os olhos curiosos e temerosos com o que vinha pela frente.
Minha formação é técnica: tinha cursado um mestrado técnico-científico no Canadá antes, e meu trabalho na Nestlé era em R&D, pesquisando e desenvolvendo novos produtos para mercados emergentes. No entanto, sempre tive bom faro comercial e de negócios e achava o mundo técnico pequeno para o que eu aspirava. Por isso, fui atrás de um programa de MBA que facilitasse a transição de carreira para o mundo dos negócios. Inocente que era, dei um google e o nome Harvard Business School apareceu como uma excelente opção para quem buscava uma formação robusta e prática em business e management. Estudei, quebrei a cabeça para amarrar minha história no application, dei o meu melhor e, com os olhos cheios de lágrima e sem acreditar, no dia 12 de dezembro de 2010 eu recebi o aceite dessa instituição que tinha um nome grande demais para caber nos meus sonhos de criança. Deu certo e em breve eu embarcaria para uma mudança de carreira, e de vida.
Um misto de empolgação, orgulho e do mais puro pavor definem o começo da minha jornada em HBS. Eu não sabia nada de business, e apesar de gostar e ter facilidade com matemática e lógica, estava morrendo de medo de não dar conta da carga acadêmica de Harvard. As primeiras duas semanas comprovaram o meu pavor. Para estudantes que não tinham experiência ou formação em negócios, a escola tem como pré-requisito um intensivão em finanças, estatística e contabilidade oferecido pela própria instituição, o temido “Analytics”. Fui forçado a fazê-lo e foi a primeira vez na vida que tive que virar a noite estudando, construindo modelos no excel, e resolvendo os assignments obrigatórios para a aprovação no programa. Hoje, refletindo, acho que academicamente foi a parte mais difícil do MBA.
Vencido o “Analytics", foi dada a largada oficial do programa, onde os alunos são divididos em sections de 90 estudantes, uma turma que viverá intensamente o primeiro ano do MBA junto. A experiência da section é curiosa: de um lado, há suporte e o senso de irmandade, com rituais, grito de guerra, líderes eleitos; de outro, uma competitividade absurda, onde os alunos são julgados por participação em sala de aula ao discutir os clássicos cases, e a nota de avaliação é uma curva forçada onde todos temem ficar no último decil, com a temida nota "3" (“1” é para o top 15%, "2” para os 75% do meio, "3” para o "bottom 10%").
Meu primeiro ano de HBS foi pesado academicamente, intenso socialmente, e transformador pessoalmente. O segundo ano foi muito mais prazeroso e focado, já que eu tinha a liberdade de escolher as disciplinas a cursar, tinha meus amigos e rede de apoio bem estabelecidos, e estava com a oferta de trabalho da consultoria McKinsey para quando o programa acabasse.
Tudo acontece depressa, e durante o programa não há muito tempo para reflexão. Com o passar dos anos, as lições aprendidas em HBS ficaram mais evidentes. Meu MBA foi muito mais do que aprendizado de conteúdo técnico; foi uma jornada de desconstrução de crenças limitantes e de construção de outras que me servem muito mais. É difícil resumir o aprendizado desses 2 anos tão intensos, marcados pela leitura e discussão de aproximadamente 550 cases, em três lições principais; porém, o exercício de síntese é poderoso, ele nos ajuda a focar no que importa e a excluir o ruído.
Saia de cima de muro e tenha sempre uma opinião, mesmo na ausência de dados estruturados e claros
A metodologia de ensino de Harvard é o case method, onde o aluno é colocado como o protagonista do caso e precisa se posicionar sobre um dilema importante envolvendo uma decisão de negócios. Para chegar a uma decisão, temos à nossa disposição as informações apresentadas nas 10-30 páginas de cada case, o que inclui tabelas e figuras com informações numéricas e vários dados qualitativos. Dificilmente há uma resposta óbvia, e para cada decisão há muitos prós e contras. A beleza da metodologia é forçar o aluno a focar no que importa, ponderando o custo de cada decisão, e a se posicionar, mesmo com muito desconforto e incerteza. O mais fácil, numa situação assim, é ficar na inércia, em cima do muro; ter um ponto de vista e defendê-lo em voz alta perante a turma de 89 outros jovens ambiciosos e sedentos pelo debate dá frio na barriga. No entanto, depois de mais de 550 cases, desenvolve-se um músculo que mescla análise crítica rápida, comunicação objetiva e assertiva, e um certo conforto em se posicionar em situações ambíguas e em ter uma voz autêntica, mesmo que contraditória. Esse protagonismo forçado tem um impacto transformador na turma na faixa etária de 26-30 anos que antes ocupava posições relativamente juniores em empresas globais e que agora é encorajada a pensar e a se comunicar como um CEO com grandes responsabilidades.
Além disso, ao analisar e se posicionar sobre os cases, somos convidados a olhar para dentro e a entender quais são nossos valores mais autênticos - muitas vezes, as decisões são tomadas a partir deles. Exemplo: seu diretor de mais alta performance é tóxico para a cultura da empresa, porém traz muito resultado comercial - você deve mantê-lo na empresa ou desligá-lo imediatamente? Em minha vida profissional pós-HBS, já me vi como protagonista de um case e me perguntei o que eu diria que o Alex deveria fazer. Esse framing, de conseguir sair do problema e ter um ponto de vista externo, menos emotivo e mais objetivo, é poderoso, e me serviu algumas vezes.
Ao mesmo tempo, não se apegue a esta opinião e esteja aberto a mudar caso haja evidência lógica e alinhamento com os seus valores
Dentro do contexto de discussão de cases, é comum o aluno iniciar a discussão com um ponto de vista e mudar de opinião à medida que mais opiniões e argumentos são apresentados. Num contexto de incerteza não há resposta certa, e apesar de ser importante tomar um posicionamento, é igualmente importante manter a mente aberta para novas informações e se permitir mudar de opinião caso faça sentido lógico. Apego a uma opinião apenas para nutrir o próprio ego não é uma opção inteligente. Estar cercado de pessoas que o fazem enxergar aquilo que você não perceberia sozinho é fundamental para chegar em melhores decisões.
A diversidade e a coragem presentes na section são uma lição para qualquer contexto profissional: esteja cercado de pessoas que o questionem, que tragam pontos de vista radicais, e fuja de contextos onde todos concordam com você. Se existir muito consenso entre a equipe há algo de errado: provavelmente há excesso de conforto para pensar em caminhos alternativos ou medo de expressar opiniões que vão contra o que o líder acredita ou gostaria. Infelizmente esse cenário de conforto ideológico faz parte da maioria das grandes empresas e até de muitas startups, inclusive de algumas early stage que acompanho de perto. Cabe ao CEO aplicar essa prática, embutindo objetividade, pragmatismo e desapego do ego na cultura da empresa através do exemplo; fácil falar, muito difícil fazer.
Foque nos seus pontos fortes, é impossível ser o melhor em tudo
O esquema de avaliação da HBS é puxado, e é muito desconfortável perceber que você não é tão “bom”quanto gostaria de ser numa série de disciplinas abordadas ao longo dos 2 anos de programa. Essas disciplinas refletem a realidade de uma empresa, envolvendo finanças, contabilidade, marketing, operações, estratégia, etc; ao ser exposto a todas as áreas de negócios é possível sentir quais áreas conversam melhor com seus pontos fortes naturais, aquelas onde seu investimento de tempo e energia gera resultados exponencialmente maiores e melhores por ser algo que lhe permite entrar em flow. Eu estava mudando de carreira, e perceber como os temas de estratégia, empreendedorismo, liderança e marketing eram muito fáceis e intuitivos para mim foi revelador. Essas foram as disciplinas em que, com pouco esforço, eu me destacava entre os melhores da turma, enquanto em outras áreas, como contabilidade, eu já não mandava tão bem.
A lição aqui é: tenha um nível de proficiência em todas as áreas, porém foque sua energia naquilo que o alimenta de verdade, pois é aí que está a grande oportunidade para gerar impacto e ser feliz ao mesmo tempo (um baita desafio).
Este artigo já está mais longo do que eu gostaria, então vou parando por aqui, rs. Entretanto, gostaria de compartilhar o quanto a jornada dos meus amigos e colegas de turma me inspira. Dez anos depois, há tanta história de transformação e busca por verdade que vou precisar de outro artigo para contar. A maioria dos meus colegas overachievers construiu muito na carreira até recentemente, e vários estão numa fase de repensar o que realmente importa e faz sentido além dos rótulos do Linkedin e pacotes de remuneração parrudos. Há gente que está focada em criar os filhos enquanto ajuda a comunidade, fundadores de unicórnios, CEOs de multinacionais, empreendedores lifestyle; há quem largou o mundo dos negócios para se dedicar à filosofia e à literatura; há também colegas que acabaram com a própria vida apesar do sucesso aparente e outros que tiveram outros fins prematuros e trágicos apesar dos cargos de partner nas melhores firmas do mundo. Combinar ambição com propósito, verdade e autenticidade não é fácil, e a jornada nunca é linear. O ego é um danado, e vale sempre lembrar dos valores que tanto discutíamos nas aulas de Authentic Leadership Development e ética.
Um Impossível por Vez, com Pedrinho Jr, CEO da Carteiro Amigo
É com muita alegria que liberamos o episódio 5 do podcast Um Impossível por Vez! Aqui, tivemos a honra de receber o Pedrinho Jr para falar sobre o empreendedorismo que tem a audácia de fugir da Faria Lima e da querida Potato Square (Largo da Batata) e vai para a favela, impactando a vida de milhares de brasileiros.
Eu e o Tiago Luz começamos este projeto com o objetivo de conversar com gente interessante que está fazendo acontecer longe dos caminhos óbvios e previsíveis. Nessa jornada, nós mesmos nos surpreendemos e nos inspiramos com as histórias dos convidados, e o Pedrinho é aquele cara com sorrisão no rosto, empreendedor raiz que dá o jeito e que não tem tempo ruim.
Fica aqui o convite para você escutar o episódio completo no spotify ou youtube, e nos seguir por lá. Tem muita coisa boa já liberada, e muito por vir.
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A sensação de que o ano está acabando já está no ar, porém ainda temos 60 dias pela frente, ou 16% do ano. Apesar do cansaço que acomete a todos, fica o meu incentivo para continuar de mangas arregaçadas e dar aquele gás para chegar em 31/12 com a sensação de que fez o seu melhor. Seja em vendas, fundraising, ou qualquer outro projeto profissional ou pessoal, não é a hora de deixar a toalha cair! O mundo está um caos, mas só controlamos o nosso contexto, então bora fazer o melhor que podemos.
Obrigado por me acompanhar, um forte abraço, e vamos que vamos!
Alex